segunda-feira, 6 de maio de 2013

Língua Portuguesa I - Aula 5

O tema da aula de hoje foi: "Introdução ao estudo do texto".

A professora Regina Crispim iniciou a primeira parte da aula retomando o que foi visto em aulas anteriores:

  • As 3 concepções de linguagem:
    • 1ª concepção: Linguagem como espelho/expressão do pensamento
    • 2ª concepção: Linguagem como instrumento de comunicação
    • 3ª concepção: Linguagem como processo/interação (Bakhtin)

  • Os 6 elementos constitutivos da comunicação e as 6 funções de linguagem deles derivadas (Roman Jacobson):
    • Emissor (emotiva ou expressiva)
    • Receptor (conativa ou apelativa)
    • Forma da Mensagem (poética)
    • Conteúdo/Contexto da Mensagem (referencial)
    • Código (metalinguística)
    • Canal (fática)

Em seguida, foi trabalhada a concepção do sujeito da produção textual enquanto entidade psico-físico-social. Essa concepção compreende as 3 concepções de linguagem estudadas: psico (1ª concepção), físico e social (2ª e 3ª concepções).

Enfatizando-se a 3ª concepção de linguagem como a mais completa em termos de descrição dos atos comunicativos, retomou-se a noção, vista na aula anterior, de que a intenção do emissor deflagra a comunicação. Entretanto, enquanto interação/processo, a comunicação prevê um receptor ativo. Dessa forma, o receptor, ao interpretar um texto, constrói significados, a partir da realidade em que se insere, de suas habilidades/capacidades inatas/desenvolvidas e dos recursos que tem à sua disposição. O processo de comunicação/leitura é, portanto, dialético.

Exemplos: deficientes físicos/visuais/auditivos ao interpretarem um "texto" - no sentido mais amplo da palavra, enquanto materialização de uma determinada linguagem - exemplificam a construção de significado a partir de habilidades/capacidades inatas/desenvolvidas; uma intertextualidade só pode ser percebida se o receptor tiver tido acesso aos "recursos" necessários para compreendê-la - nesse caso, o "texto" a que se refere o emissor, como é o caso da gravura à esquerda, em que se faz referência à pintura "O Grito", do norueguês Edvard Munch.



Trabalhando em mais profundidade o conceito de "texto", pode-se defini-lo como a "unidade mínima significativa à qual é possível conferir um sentido". 

Nesse ponto da aula, a professora apresentou uma crítica a Saussure, linguista que teria separado a fala da escrita, considerando esta última como menos variável e, portanto, mais passível de uma análise interpretativa eficaz. 

Também foi feito um contraste entre gramáticas que param no estudo da frase como unidade mínima significativa (visão de Jacobson) e gramáticas gerativistas, as quais privilegiariam a criatividade da linguagem e o texto como unidade mínima significativa. Segundo as gramáticas gerativistas, a partir de uma estrutura inicial de oração/frase, o emissor poderia criar novas estruturas, derivadas da original, não sendo necessário (nem possível!) aprender todas as estruturas existentes em uma linguagem para um bom desempenho linguístico (visão de Chomsky).

Exemplos: As frases "Acordei cedo", "Vi as rosas" e "Fiquei infeliz" possuem, isoladamente, um significado próprio. Entretanto, em conjunto, elas não formam uma unidade significativa, não formam um "texto". Falta um contexto que explique a infelicidade do eu-lírico ao ver as rosas. As frases "Acordei tarde", "Cheguei atrasado" e "Perdi a prova", além de possuírem um significado quando isoladas (orações coordenadas assindéticas), quando juntas, elas formam um texto, isto é, uma unidade mínima significativa que prescinde de qualquer outra informação adicional.

Falou-se ainda do texto como matriz para a ocorrência coerente dos elementos do sistema linguístico. Dois importantes elementos dessa matriz são o gênero e o tipo textuais.

Os gêneros são variados e têm a ver com o conteúdo dos textos. São dinâmicos, surgindo com o desenvolvimento da linguagem, em sua interação diacrônica com a realidade social. Os tipos são mais restritos e têm a ver com a forma dos textos. São exemplos de tipos de texto: o narrativo, o argumentativo e o descritivo.

Na segunda parte da aula, comentou-se que o "sujeito-leitor se constitui na relação com a linguagem", isto é, a linguagem contribui para formação da identidade do leitor. Essa identidade, segundo Barthes, define a quais pontos o leitor inclinará o seu olhar, em seu processo de leitura interativa do texto.

Falou-se ainda do autor do texto como o seu primeiro leitor e, portanto, criador do efeito-leitor, isto é, da leitura esperada do texto, a qual revelaria as intenções do autor ao escrevê-lo. Desse modo, "a leitura é/realiza esse jogo, esse trabalho do sentido sobre o sentido".

Comentou-se sobre a necessidade de se levar em conta o contexto de produção do texto, o qual se pode denotar a partir de marcas ideológicas, bem como a partir de marcas no próprio signo/código. Exemplos: diferenças que podem ser encontradas entre a grafia de vocábulos aqui no Brasil e a realizada em Portugal; o histórico "ph" em "pharmacia" ou o "h" de Bahia.

Resumindo a temática da aula de hoje em uma frase: "A materialidade da ideologia é o discurso; a materialidade do discurso é a língua/linguagem; e a manifestação concreta da discursividade é o texto." Ou seja, a intenção/ideologia do emissor, materializa-se em um discurso, pontapé inicial para a comunicação. O discurso sistematiza-se e organiza-se ao submeter-se à codificação e nuances da linguagem, enquanto processo/interação. Por sua vez, a linguagem materializa-se, enquanto unidade mínima significativa, no texto.

Encerrou-se a aula fazendo-se uma interpretação do poema "O assassino era o escriba", de Paulo Leminski.

O assassino era o escriba 
Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito
Inexistente.
Um pleonasmo, o principal predicado da sua vida,
regular com um paradigma da primeira conjugação.
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial,
ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito
assindético de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os EUA.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido em sua bagagem.
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas,
conectivos e agentes da passiva, o tempo todo.
Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.

No poema, Paulo Leminski utiliza a função metalinguística da linguagem para promover o efeito de humor, promovendo a aproximação entre a temática explorada (o enfadonho estudo de sintaxe da língua portuguesa experimentado pelo eu-lírico e por muitos estudantes) e sua expressão poética.

A adesão do leitor à imagem do professor criada por Leminski é imediata, devido à identificação entre leitor e eu-lírico, muito provavelmente co-experimentadores de um mesmo contexto de aprendizagem formal da gramática/sintaxe.

Marcas - como a forma verbal "era", no título, possivelmente remetendo ao "era uma vez" de alguns contos infantis - permitem classificar o texto como pertencente ao gênero conto/poesia de ficção, por exemplo. A presença  de um narrador, de personagens, de uma sequência ínicio-meio-fim e de uma descrição de personagens seguida por um enredo permitem classificá-lo como pertencente ao tipo "narração".

O elemento de coesão "o", em "matei-o", no último verso, permite a leitor fazer as trajetórias do professor e do aluno no poema. O professor começa como sujeito ("Meu professor", no primeiro verso) e termina como objeto ("matei-o"). O aluno, por sua vez, inicia-se como objeto de tortura do professor e termina como sujeito/autor do crime ("matei").

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