sexta-feira, 3 de maio de 2013

Cultura Brasileira I - Aula 4

Na primeira parte da aula, foi exibido o documentário "Somos Yanomami", produzido pelo Ministério da Cultura e pelo Conselho Nacional da Cultura venezuelanos.

Os Yanomami são um grupo de aproximadamente 20.000 pessoas, distribuídas em 200-250 aldeias indígenas na fronteira entre o Brasil e a Venezuela.1

A professora Luciene Dias iniciou a discussão falando sobre a etnografia como metodologia da antropologia no estudo de etnias.2 Ela mencionou ainda as diferentes abordagens que podem ser empreendidas nesse estudo: a do jornalista, a do sociólogo e a do antropólogo. Metaforicamente, o jornalista aproximaria-se de tais comunidades fazendo um sobrevoo sobre as mesmas; o sociólogo passaria de carro, um pouco mais próximo, mas ainda distante da realidade das aldeias; o antropólogo viria à pé e nu, despido de pré-conceitos, disposto a viver em contato e em troca com os nativos.


Na segunda parte da aula, foi discutido o capítulo 7 das "Memórias Sanumá", de Alcida Rita Ramos, fazendo um paralelo do mesmo com o documentário "Somos Yanomami".

O texto discorre sobre o fato de os Sanumá manterem seus nomes em sigilo, passando toda uma vida sem saber ou sem divulgar os seus próprios nomes. O texto trabalha o significado que os nomes próprios têm para os Sanumá, bem como os conceitos de privado e público para os mesmos.

A professora destacou a existência de quatro troncos linguísticos:
  • Yanomami
  • Yanoman
  • Yonam
  • Sanumá

Os dois primeiros, pelo histórico de trocas culturais com o Ocidente, estariam mais próximos do que se poderia chamar de cultura ocidental. Ao afirmar "Somos irmãos, mas somos diferentes", ao final do documentário, o Yanomami entrevistado revela a diferença de costumes existente entre a sua cultura e a cultura ocidental, bem como entre a sua cultura e as dos demais povos Yanomami - como, por exemplo, os Sanumá.

Pode-se depreender do texto de Rita Ramos que, ao contrário dos Yanomami do documentário, os Sanumá  encaram as esferas pública e privada de forma distinta. "O ato de nomear não é tão inocente e folclórico quanto parece."3 O nome de um Sanumá traz consigo um conceito, uma organização social, uma história. Não se trata apenas de uma identificação pessoal, isto é, um modo de se distinguir dos demais. Trata-se de uma identidade coletiva, ou seja, uma maneira de evidenciar o pertencimento a uma determinada comunidade local, suas tradições, sua cultura.

Para a cultura ocidental, o ato de nomear, em geral, não traz tal conotação. Para a cultura brasileira, em particular, são comuns os estrangeirismos e nomes que pouco têm a ver com a ascendência ou identidade dos indivíduos. Em muitos casos, os nomes revelam o passado de dominação europeia, a estrutura de exploração colonial que aqui se implantou. Não raro, o ato de nomear segue ainda padrões ideológicos hegemônicos. Não haveria uma tradução do pertencimento, da noção de coletividade, como há entre os Sanumá.

Nesse ponto da aula, surgiram algumas discussões em torno do tema, como o debate sobre o que se considera primitivo e do que é considerado moderno ou civilizado. A professora contrastou ainda os saberes locais com as interpretações "globalizadas", a busca por uma explicação única e geral para diferentes realidades do "ser" humano. Numa crítica à cultura ocidental, ela ilustrou as diferenças entre as árvores genealógicas do mundo ocidental e as do mundo Yanomami. As primeiras estariam centradas no indivíduo em questão (egôcentricas), enquanto as últimas evidenciariam o coletivo. Falou-se ainda em pasteurização das relações sociais, um processo pelo qual "aspectos considerados perturbadores da realidade social são travestidos em aspectos inócuos, destituídos de vida própria ou convertidos em preceitos morais. Por outras palavras: a pasteurização social procura eliminar os micro-organismos patogênicos sociais."4 Daí as não raras crises de identidade, solidão e depressão no mundo ocidental. Exemplificando essa temática do "pertencimento", Carolina Otto leu o texto "Pertencer"5, de Clarice Lispector.

A professora retomou, então, uma indicação feita na aula anterior, o poema "Me gritaron negra", da mexicana Victoria Santa Cruz.


Diante da crise de identidade do mundo ocidental (em particular, na realidade brasileira), Victoria Santa Cruz convida a uma afirmação positiva de identidade: "Sim, sou negra!".

No caso dos Sanumás, a singularidade de um indivíduo traduz-se através de seu próprio nome. Ao incorporar informações acerca de sua linhagem e comunidade, o nome de um Sanumá, ao mesmo tempo que o distingue dos seus xarás, insere-o em sua coletividade de origem.

Apesar de algumas crenças Sanumás também justificarem o fato de os seus nomes serem mantidos em sigilo (como o mal que um determinado inimigo poderia causar-lhes, pelo pronunciar de seus nomes próprios), a questão do sigilo dos nomes parece ser mais uma questão de etiqueta, recato e respeito com a "pessoalidade", privacidade e identidade de cada um. Não há problema algum em conhecer o nome de um Sanumá, a questão gira em torno do uso do nome em si - como exemplificado no texto pelo episódio em que uma missionária, em alta voz, chamava a todos pelo nome, desconsiderando esse aspecto de sua cultura.

Pelo fato de os nomes Sanumás trazerem toda uma história pessoal, sobretudo valores da esfera privada, pode-se fazer uma aproximação entre a sua prática de sigilo de nomes próprios com a prática ocidental de silenciar-se quanto ao que é privado, quanto ao que se é de fato, quanto à afirmar-se enquanto singularidade/coletividade.

Texto para a próxima aula: "Identidades políticas e alteridades históricas: uma crítica às certezas do pluralismo global", artigo de Rita Laura Segato.

Referências
  1. http://en.wikipedia.org/wiki/Yanomami
  2. http://pt.wikipedia.org/wiki/Etnografia
  3. Notas de aula.
  4. http://oficinadesociologia.blogspot.com.br/2012/05/pasteurizacao-social-23.html
  5. http://pensador.uol.com.br/frase/MjcxMTY/

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